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Crítica: Histórias Cruzadas

Um filme pode ser feito para ganhar os principais prêmios do Oscar, mas isso não significa que os mereça. É mais ou menos esse o caso de Histórias Cruzadas, que contém basicamente todos os elementos possíveis para agradar não só o público, que adora uma história de superação, mas também aos votantes do prêmio da Academia, geralmente anestesiados mais pela mensagem que um longa quer passar do que pela eventualmente transmitida.

O filme, baseado no livro A Resposta, de Kathryn Stockett, se esforça demais para mostrar as brutais consequências da perseguição aos negros nos EUA na metade do século passado, mas por conta de um ponto de vista equivocado, acaba passando uma ideia extremamente racista. Muito provavelmente não era essa a intenção do diretor Tate Taylor, o que prova uma enorme falta de tato, já que o roteiro também é assinado por ele, em perceber como tratar um assunto tão delicado.

A protagonista da história deveria ser a governanta negra Aibileen Clark, numa interpretação brilhante de Viola Davis, mas acaba se tornando a jovem recém-formada em jornalismo Skeeter Phelan, vivida por Emma Stone. E é justamente aí que reside o maior problema do texto, por não perceber que mostrar a garota branca como única “salvação” para o grupo de outras empregadas domésticas afroamericanas da cidade de Jackson, no estado americano de Mississipi, é uma jogada preconceituosa, que chega a diminuir a importância de diversos movimentos liderados por negros como Martin Luther King, por exemplo.

Mas não é só aí que reside o racismo involuntário (pelo menos espera-se que seja) de Histórias Cruzadas. É inadmissível, em pleno século 21, que empregadas negras, mesmo que da década de 60, sejam mostradas de forma mais caricata que a Mammy de E O Vento Levou. Octavia Spencer que o diga, com sua Minny Jackson, numa caracterização que exagera o que a atriz já está acostumada a fazer e só colabora para a ideia equivocada do roteiro de que a mostrar assim ajudaria a torná-la um bom alívio cômico. O humor vindo de Spencer está em todos os motivos errados. E é uma aberração a intérprete não ter percebido isso e se propor a levar adiante tal afronta.

A forma com que a história trata os homens negros também não é a mais lisonjeira. Os maridos são figuras ausentes e abusivas, “vilões” sem rosto que jamais movem um dedo para ajudar as esposas, como se todos fossem coniventes com aquela situação.

Dotado de um maniqueísmo condenável, o roteiro de Taylor tenta manipular o espectador mais desavisado de todas as formas possíveis. Um bom exemplo é a vilã interpretada por Bryce Dallas Howard. Não bastasse mostrá-la como uma racista deplorável, ela também precisa ser cruel com a mãe, relapsa com o marido e invejosa com as amigas. No terceiro ato há até mesmo a inclusão de um problema de pele, fazendo surgir uma mancha em sua boca, sem nenhum motivo aparente, apenas para torná-la mais grotesca aos olhos do público.

Como nem só de erros é feito o longa, Jessica Chastain é um dos bons destaques, no papel de Celia Foote, a mulher excluída pelo grupo liderado por Dallas Howard. Não à toa, recebeu uma indicação ao Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante por seu papel, embora fosse mais justo indicá-la por sua participação em Árvore da Vida, de Terrence Malick. Primeiro porque no filme do consagrado cineasta, Chastain interpreta uma personagem tridimensional e cheia de nuances. Segundo porque infelizmente o texto de Histórias Cruzadas não é muito feliz ao retratá-la extremamente fragilizada, apenas para a audiência se sensibilizar com sua situação.

Outro bom aspecto do longa é sua recriação da época, embora as paletas de cores exageradas dêem a impressão de que a única base para o departamento de arte na criação de figurinos e cenários foram ilustrações como a que aparece enorme, pintada na parede externa de uma lanchonete.

Mas não se deixe enganar. Talvez o longa o divirta e o emocione no cinema mas, caso aconteça, saiba que não foi pela força da história e sim pela manipulação presente no roteiro. Por fim, com a indicação de Histórias Cruzadas ao Oscar de Melhor Filme na edição deste ano, comprova-se que os planos do diretor e dos produtores funcionaram perfeitamente. Pelo menos nisso, porque como filme de mensagem de tolerância, falha miseravelmente.
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